Por 25 anos um simpático e solícito senhor trabalhou como porteiro no estacionamento do England’s Bristol Zoo, cobrando US$ 1.40 de cada um dos 150 carros e US$ 7.00 de cada ônibus que, em média, utilizavam-se do espaço diariamente.
Num belo dia, o pontual servidor desapareceu e não foi trabalhar. A administração do zoológico de Bristol, Inglaterra, comunicou-se com a Prefeitura, solicitando um novo atendente. Depois de algumas horas das internacionalmente famosas pesquisas, a prefeitura respondeu que o estacionamento era da responsabilidade do próprio Zoológico, não dela.
A administração do Zôo replicou que o atendente era um empregado da Prefeitura. A Prefeitura, por sua vez, insistiu que o atendente do estacionamento jamais esteve na sua folha de pagamento. Enquanto os burocratas discutiam, na Europa, instalado em sua bela residência em algum lugar no mediterrâneo, um homem goza de merecida e opulenta aposentadoria, conquistada durante 25 anos de trabalho diário.
Consta que, sabedor da burrocracia oficial, ele simplesmente instalou-se no local e começou a aparecer, todo dia, coletando e guardando as taxas de estacionamento, estimadas em US$ 560 por dia, durante sete dias por semana, num total aproximado de sete milhões de dólares ao longo dos 25 anos.
Recentemente um amigo deste espaço deparou-se com seu nome sendo procurado como testemunha em uma ação contra determinado parlamentar. Como desconhecia tal situação, tratou logo de comunicar-se e apresentar-se à Justiça, voluntariamente. Depois de percorrer 19 seções, desistiu de tentar “se entregar”, preferindo voltar à condição de morador do incerto e não sabido.
Algo semelhante ocorreu com outro conhecido, proprietário de uma empresa destruída por um desastre natural. Devedor do fisco tentou, igualmente em vão, acertar as contas, para ver se livre das dores da tortura fiscal. Desastre total. Uma via-sacra sem fim e nada de resultado. Ninguém sabe informar como proceder, a não ser de que somente é possível via internet onde é impossível dialogar ou conseguir um número que falta no preenchimento dos intermináveis formulários eletrônicos.
A conclusão é simples. Ninguém sabe absolutamente nada. A petulância, o olhar superior, a falta de civilidade, educação, respeito são imperativos e camuflagens para a ignorância. E o calvário do cidadão é engolir sapo, sentir desprezado e útil apenas para sustentar o salário dos sabichões concursados ou não.
É o non liquet* do burocrata que do pedestal da empáfia, é incapaz de confessar a dúvida, preferindo a sentença arbitrária onde o réu, no caso o cidadão, é sempre condenado. É como se diz sobre as ditaduras. O pior delas é a autoridade do guarda da esquina. Na atual, o pior é autoridade da cavalgadura geral do mundo sem fim de asnos alados.
* Non liquet – abreviatura de“iuravi mihi non liquere, atque ita iudicatu illo solutus sum”, algo próximo a “jurei que o caso não estava claro o suficiente e, em conseqüência, fiquei livre daquele julgamento”. Declarando o “non liquet”, o juiz romano eximia-se da obrigação de julgar os casos em que não tinha absoluta certeza de qual a decisão correta a tomar. No Direito atual, o Juiz não pode apelar para o expediente, sendo obrigado a tomar uma decisão, mesmo que não esteja seguro sobre a melhor solução.